Desde que nasci, tive que esperar mais de dez anos para ver o meu F.C.Porto ganhar um título nacional (Taça de Portugal de 76/77), mas durante todo esse tempo aprendi a ser Porto, e a saber sofrer por ele, porque valia a pena… porque me identificava com o que via… e porque gostava da filosofia que o clube seguia…
Mais tarde aprendi que vencer afinal não era a excepção, mas sim a normalidade, e nessas alturas aprendi que se amamos realmente o nosso clube, aquilo que temos que fazer, mais do que festejar nas vitórias, é saber estar ao lado do clube, principalmente nas horas menos boas. Temos tido algumas (embora poucas)…
No entanto há uma exigência da minha parte para estar ao lado do clube, que para mim é “cinequanon”, e que tenho visto não ser cumprida nestes últimos tempos, sem a qual é difícil manter-me identificado com o rumo que temos vindo a seguir.
Esse requisito que eu reclamo chama-se “ATITUDE À PORTO”. Pode parecer que se trata de um chavão, mas acreditem que é muito mais do que isso…
Querem saber o que é para mim “ATITUDE À PORTO”?
Vou contar-vos uma “história” que exemplifica bem aquilo a que eu estou habituado, e com que me identifico. Depois, desafio-vos a dizerem-me quem neste momento dentro da nossa estrutura seria capaz de ter uma atitude destas….
A época 2002/03 foi de boa memória para os Portistas, graças à conquista da Liga, Taça de Portugal, e Taça UEFA. Numa temporada recheada de grandes momentos, destacam-se jogos como a vitória por 3-1 no estádio do Belenenses, com dois golos de Jorge Costa.
Noite de 19 de Janeiro de 2003, intervalo no Estádio do Restelo. O Belenenses, à época uma espécie de “besta negra” do F.C.Porto, recolhia aos balneários a vencer por 1-0. Mesmo no final da primeira parte, Capucho tinha falhado um golo de baliza aberta e a maldição azul, sobre os azuis-e-brancos parecia manter-se activa. Os Dragões já não venciam os lisboetas há três anos, e no Restelo o jejum tinha mais de seis anos.
Jorge Costa recorda-se que, apesar de algumas ocasiões desperdiçadas, a exibição do F.C.Porto não estava a ser brilhante: “Vamos para o intervalo a perder e há uma conversa um bocado acesa no balneário. Tínhamos grandes dificuldades e um historial difícil com o Belenenses” – relembra Jorge Costa.
O que se passou durante o descanso assumiu uma dimensão quase mitológica, mas é certo que algures no seu discurso o capitão portista chegou a ameaçar abandonar o futebol se os Dragões não vencessem.
“Algo se passou entre quatro paredes, que foi mais ou menos público, e não foi mais do que eu como capitão, chegar ao balneário e ter uma conversa um bocado acesa com os meus colegas, antes do treinador chegar. O intuito foi unicamente o de acordarmos um bocadinho, termos vergonha na cara e darmos mais. Achava que o que tínhamos feito até então era pouco. Depois dessa conversa, tive a felicidade de participar de forma determinante na viragem do jogo” – explica o capitão.
Três minutos depois do recomeço, o 1-1 surge através de uma cabeçada de Jorge Costa na sequência de um canto: “É o ponto de viragem, e se não é feito naquela altura, provavelmente o jogo teria outro rumo” – reconhece.
Ao minuto 52. Jorge Costa recupera uma bola a meio campo, em antecipação, e galga 20 metros, servindo Derlei. Este cruza na esquerda para o remate de primeira de Hélder Postiga, que Marco Aurélio defende. O capitão não tinha deixado de acompanhar o lance e surgiu em posição privilegiada para a recarga, fazendo o 2-1.
Estava consumada a reviravolta, de forma quase épica. No espaço de quatro minutos, e apenas uns 15 depois de ter “puxado as orelhas” aos colegas no balneário, o “Bicho” bisava e colocava as coisas no seu lugar: “Estes golos foram muito especiais pelo significado e pela história. Quando se confronta dez jogadores mais os suplentes de uma forma violenta e depois se tem a sorte de fazer dois golos, isso fica para sempre. Este segundo golo não foi seguramente excepcional em termos técnicos, mas valeu pelo significado que teve” – observa Jorge Costa.
“Os segundos 45 minutos em Belém fizeram-nos ver que, se encarássemos sempre os jogos com seriedade, vontade e profissionalismo dificilmente perderíamos. Tínhamos uma equipa superior às outras, mas isso era curto. É preciso mais do que ser melhor que os outros” – concluiu Jorge Costa.
Como podem rapidamente concluir, neste momento não temos ninguém dentro do balneário capaz de uma atitude destas, por isso, eu acredito que está na hora de deitar tudo abaixo e construir de novo. É esta a altura de começar do ponto zero, mas começar com “ATITUDE À PORTO”, começar com jogadores e estrutura, com a qual todos nos identifiquemos, mesmo que isso nos possa custar algumas conquistas.
Quero voltar a sentir, que me identifico, e que partilho a mesma filosofia com quem está dentro das quatro linhas a defender as minhas cores. Enquanto não sentir isso, vai ser difícil SER PORTO…
Mas como estou habituado a “coisas” difíceis, irei continuar a sofrer e a lutar pelo meu Porto… Porque Ser Porto, não é aparecer nas vitórias, e escondermo-nos nas derrotas. Ser Porto, é sabermos dar o “corpo às balas” sempre, porque Ser Porto, é sempre um orgulho, em toda e qualquer circunstância… e é isto que nos diferencia de todos os outros…
Escrito por: Paulo Bizarro