Não havia dinheiro para o táxi!!…
Dois dias, que Iker Casillas nunca vai esquecer…
O dia em que foi chamado pela primeira vez para estar num jogo com a equipa principal do Real Madrid e o dia da sua estreia pelo clube “merengue”:
“Estava com um amigo numa classe de desenho no Liceu em Móstoles.
Estava ao lado do meu amigo, Julito, e estávamos falando do Real Madrid.
Era uma época, em que o Real Madrid não estava jogando bem.
Na altura, o treinador era o Jupp Heynckes.
Na baliza estava o Bodo Ilgner, que tinha vindo no ano anterior com o Capello e o suplente era o Santiago Cañizares.
E de repente entra alguém na sala, e diz:
“Iker, tens de ir falar com o director.”.
E eu fui…
O director disse-me:
“Escuta Iker, tu tens de ir imediatamente para Madrid e para o hotel Alameda em Barajas.
É lá que está a equipa principal do Real Madrid.
O Cañizares lesionou-se.
E tens de ir com eles para a Noruega!”.
Volto para a minha classe correndo, começo a arrumar as minhas coisas o mais depressa que podia, e o Julito diz-me:
“O que é que se passa?!”.
E respondo:
“Tenho que sair já! Tenho de ir para a Noruega com o Real Madrid!!”.
E ele…
“Que dizes?! Mas que dizes?!”.
Saí correndo e cheguei à sala do director…
E ele diz-me:
“Telefona já para casa, que tens de ir buscar um fato e ir já para o hotel…”.
Eu fiquei aflito…
Como ia telefonar para casa, se nem existiam telemóveis?!
E se existiam, eu não tinha um…
A minha mãe telefonou para a escola em pânico e diz:
“Vem já para casa e vem correndo!!”.
E eu disse:
“Mamã, eu levo uns 15, 20 minutos para chegar a casa correndo…”.
E o director vendo aquilo tudo diz:
“Não te preocupes, que eu levo-te a casa.”.
Ele levou-me num carro branco…Entro em casa e a minha mãe:
“Corre! Corre!! Veste-te…que tens de apanhar um táxi!
Tens de chegar ao hotel Alameda.
Vais poder estar com a primeira equipa, que o Cañizares lesionou-se!”.
E eu…
“Mas que roupa uso?”.
E a minha mãe:
“Mete um fato, que eles pediram que vás de fato.”.
Foi como remendos…
Cheguei ao quarto, e vi diferentes fatos que me iam oferecendo para ir com as selecções espanholas nas camadas jovens.
Peguei nuns sapatos daqui, umas calças dali, um casaco dali, uma gravata vermelha, que não tinha nada a haver…
Levei tudo!!
E chega o táxi à porta. Estávamos em 1997.
A minha mãe em casa, coitada…
Num apartamento de 60 metros quadrados, nem tinha dinheiro para pagar ao táxi…
Telefonaram do clube e disseram:
“Não se preocupem, porque quando o táxi chegar ao hotel, o delegado da equipa aparece na porta e paga o táxi.”.
Apanho o táxi e começo a ver o taxímetro.
Naquela altura, era em pesetas…
4000, 5000, 6000, 7000…
O taxista olhava para mim e pensava:
“Este miúdo apanhou um táxi desde Móstoles até Madrid e não me vai pagar as 8000 pesetas ou o que der a corrida…”.
E eu digo ao taxista:
“Se não se importa de esperar um segundo, vai aparecer um senhor e pagar-lhe.”.
Chegamos.
O delegado, Enrique Martín, saiu do hotel e soltou o dinheiro.
Levou-me até onde estavam os jogadores, que estavam comendo no hotel.
Apresentou-me a todos.
Lembro-me disto…
Sentei-me ao pé do Fernando Sanz, do Morientes e do Clarence Seedorf.
Eu estava “flipando”…Estava “flipando”…
Durante a viagem estava “flipando”, quando os conheci estava “flipando”…
Imagina, que isto me acontece nos dias de hoje.
Teria telemóvel, redes sociais, e desde a minha casa em Móstoles, até ao hotel, estaria o tempo todo comentando ou publicando fotografias…
Mas eu estava ali sozinho com os meus pensamentos.
E chegas ali…e vês aquelas estrelas todas?!
Eu tremia por todos os lados…
Fui para a Noruega, deram-me o número 26 e sentei-me no banco de suplentes.
Passei um frio tremendo…
Mas lembro-me sempre desse dia com muito carinho. (…)
No dia 11 de Setembro de 1999, foi quando estreei-me na baliza do Real Madrid.
No dia anterior, íamos para Bilbao e estávamos no autocarro.
Quando o Toshack senta-se ao pé de mim, e diz-me:
“Como estás miúdo?”.
E eu:
“Estou bem.”.
E ele:
“Estás tranquilo?”.
E digo:
“Sim.”.
E ele:
“Ainda bem, porque amanhã vais jogar..”.
Foi assim…
Disse-me isto, levantou-se e foi-se embora para a frente do autocarro…
Fiquei a pensar:
“Como?!
Vou jogar?! Mãe do Céu…Amanhã jogo?!
Como vai ser?
Estava jogando na terceira divisão, até à três meses atrás…”.
Existiam umas 300 pessoas por jogo nas bancadas, vendo-me jogar na terceira divisão.
E, agora, ia jogar contra Athletic Bilbao, no San Mamés, um estádio emblemático, com 50 000 pessoas e um meio de comunicação de Madrid só para seguir o meu aquecimento…
Passei muito mal nesse dia e nessa noite!
Muitos nervos, tremia…
Empatámos a dois golos.
Sempre que sofria golos, ia para casa chateado.
Mas nesse dia, nem fiquei chateado.
Fiquei contente.
Tinha jogado pelo Real Madrid em San Mamés.
Nesse ano acabamos por ganhar a Champions em Saint-Denis.”.
Um dia não existe dinheiro para o táxi, algum tempo depois, és campeão europeu pelo Real Madrid!
Pode acontecer!!
Foi o que aconteceu a Iker Casillas…
Crónica de showbebola