Os primeiros passos no Foz: “Já lá vão muitos anos. O futebol sempre esteve dentro de mim. Ia para a escola e levava a bola debaixo do braço, jogava futebol de cinco e de sete no bairro. Aos 14 anos, por influência do senhor Amadeu, fui treinar ao Foz. Era juvenil de primeiro ano, fiz um treino e pediram-me logo o Bilhete de Identidade para me inscreverem
Central e avançado: “Era central, era ponta de lança e jogava com o número 10. Nesse ano jogámos por três vezes com o FC Porto e no final do ano tinha propostas do FC Porto, Leixões e Boavista. Fui com o meu pai falar com o presidente do Foz que, por razões escolares, disse que o melhor para mim era o Leixões ou o Boavista. Felizmente que a meio da conversa o meu pai virou-se para mim e perguntou o que queria eu. ‘Não há dúvidas, Porto’, disse. No FC Porto, com Costa Soares, jogava também como central e ponta de lança. Havia jogos que vencíamos por 15-0, 16-0 e estava lá atrás sem fazer nada. Nesses jogos o Costa Soares metia-me como ponta de lança. A diferença de tamanho era descomunal e marcava golos atrás de golos.”
Falhar o treino e o cabelo: “Lembro-me que no Foz havia treinos à terça e à quinta e o primeiro da semana era físico. Nunca gostei desses treinos. No FC Porto pensava que podia fazer o mesmo e faltar a treinos. Um dia, é certo, falhei um treino do FC Porto, não sei bem porquê. Talvez estivesse na Foz e tivesse de apanhar o 78 até às Antas, não sei. No dia seguinte o Costa Soares perguntou-me porque faltei ao treino e esse foi o primeiro choque da mudança do Foz para o FC Porto. A história do cabelo é outra. Tinha um corte à ‘rockabilly’ e o Costa Soares perguntava-me sempre se eu tinha vindo com a cabeça de fora da janela do elétrico desde a Foz. Costa Soares era um ser excecional, muito profissional e um apaixonado pela formação”
Ídolos e exemplos: “Nunca fui muito aquele jogador de olhar para outros e tentar fazer igual. Lembro-me de ir às Antas para ver o Madjer, um jogador diferente do que eu era mas que me enchia as medidas. Eu era portista, jogador do FC Porto e adepto de bancada, por isso o Madjer era o meu ídolo”
A estreia nos seniores do FC Porto: “Era o rapaz das chamuças, que era uma das praxes. Nunca mais me esquecerei do João Pinto a dizer ‘miúdo vai buscar as chamuças’. E lá fui buscar as chamuças à Primazia antes de irmos para estágio. Fui levantar a encomenda, apanhei trânsito e cheguei atrasado às Antas, já todos estavam dentro do autocarro. E eu a pensar o que fazer, as chamuças deixavam cheiro, os treinadores iam perceber… Mas, tinha de entrar no autocarro, estavam lá o João Pinto, o André, o Jaime Magalhães os meus ídolos. Anos depois fui eu que passei a fazer isto e sempre com chamuças. Como treinador sei hoje que isto faz mal, mas criava espírito de grupo
Titular indiscutível com António Oliveira: “Bebi muito de todos os treinadores e tive sucesso com vários treinadores, sistemas e metodologias de treino. Podes ganhar de várias formas, não há uma fórmula mágica de sucesso. O António Oliveira era um caso especial. Gosto muito dele. Ele tinha a capacidade de mexer connosco com a mística, a guerra… Com Robson era o jogo pelo jogo. Corremos, rematamos e ganhamos. Com Oliveira era mais a vertente psicológica, mais emocional. Antes dos jogos com o Benfica era bravo. Se o meu pai estivesse vestido de vermelho atropelava-o, se a minha mãe estivesse de vermelho atropelava-a. O Oliveira tinha a capacidade de mexer connosco”
Competitivo e concentrado: “Um dia chamaram-me de animal competitivo. Não jogar, não poder ajudar o meu clube no campo, custava-me. Não que fosse um mau suplente, mas sempre quis mais. Tenho uma carreira de que me orgulho, mas tenho noção de que não era um jogador extraordinário. Compensei sempre com dedicação, trabalho, empenho. Jamais um adepto me disse que o “Bicho” não deu tudo. Eu tinha algumas limitações, tinha noção delas e escondia-as ao máximo com aquilo em que era bom. Era muito concentrado no treino e no jogo e isso fez a diferença. Tinha colegas que eram melhores e era eu que jogava.”