Um dos ciclistas que representou o FC Porto nos primeiros
tempos da participação portista em provas já de cariz oficial, em que também se
salientou então, foi Elias Cruz.
Elias Ferreira da Cruz, nascido em S. Bernardo, próximo de
Aveiro, a 3 de Abril de 1911, cedo começara a sentir paixão pela bicicleta,
algo que o levou a inscrever-se em muitas provas regionais, que geralmente
ganhava.
Este amontoar de êxitos levava as pessoas a afirmarem, antes
de cada prova, que “O Elias vai ganhar”. Então (segundo descrição na página
informática da sua freguesia, em “www.freguesiadesaobernardo.pt/desporto”) «um
Diretor do F.C. Porto, a exercer a sua atividade profissional numa Fábrica de
Sabão, em Aveiro (na Rua de São Martinho), ouvindo tantas pessoas a afirmarem
que o “Elias ganhava sempre”, resolveu indagar quem era esse tal Elias. E assim
foi estabelecido o primeiro contacto». Entretanto, numa dessas corridas foi
visto por esse elemento afeto ao F. C. Porto, o qual apreciando as qualidades
da robusta pedalada de Elias Cruz o convidou a ingressar na equipa do grande
Clube do Norte. Como ele porém não tinha bicicleta apropriada «os Diretores do
F.C. Porto, conhecedores do seu valor, ultrapassaram o assunto dando-lhe uma
bicicleta marca Vilar, sem mudanças, que pesava 19,5 kg. A correr com essa
bicicleta, Elias tinha direito aos seguintes prémios, conforme o lugar em que
se classificasse: – 1.º lugar numa prova: 1$00 ao km; – 2.º lugar numa prova:
$80 o km; – 3.º lugar numa prova: $60 o km.» Indo então ao Porto «de comboio,
onde assinou a ficha de Atleta pelo F.C. Porto.» Estava-se em 1933 e Elias
acabou por correr pelo F.C. Porto até 1936. Mas «só raramente ia fazer um
treino ao Porto» preparando a correr em trajetos da sua região. E «quando havia
alguma prova o F.C. Porto enviava-lhe, na véspera, um telegrama para ele se
apresentar na Sede do FC Porto no dia seguinte a uma determinada hora. O clube
pagava-lhe as deslocações de comboio, das vezes em que o Elias não resolvia ir
de bicicleta, mais a estadia e o táxi.»
= 1935 – Caricatura – ELlAS CRUZ em desenho dum artista aveirense de assinatura A. Torres (em “Almanaque Desportivo de Aveiro”)
Elias estreou-se oficialmente em 1933 na categoria de
«principiantes», mas competindo com os outros mais velhos, e logo se salientou
correndo o Porto-Braga-Porto, prova em que triunfou. Tão auspiciosa estreia foi
então prenúncio de novos e sucessivos triunfos, conquistados em competição com
os melhores valores do Norte e mesmo do Sul. Assim, foi o vencedor de várias
provas, entre as quais se destacam o VI GIRO DO MINHO, em 1934, os 100 KMS
CLÁSSICOS e o I PORTO-VIGO-PORTO, em 1935. Além de ter alcançado o título de
Campeão do Norte em três anos consecutivos (1934, 35 e 36).
Também (segundo sua biografia na página de sua freguesia)
venceu o Circuito de Vila Nova de Gaia disputado por eliminatórias», no qual,
«em luta com os melhores ciclistas nacionais, venceu sucessivamente todas as
eliminatórias e a final.» Bem como «no Circuito da Bairrada, uma grande estrela
do Ciclismo Nacional, Nicolau, vergou-se a um 2.º lugar, ficando o Elias em
1.º». E «no Grande Prémio da Delegação do Porto da União Velocipédica,
encontram-se frente a frente a estrela máxima do Ciclismo Nacional da altura,
Alfredo Trindade e um valoroso ciclista, Elias Cruz… Uns anos antes tinham
surgido as primeiras bicicletas com mudanças, que imprimiam maiores velocidades
com menor desgaste físico dos atletas. Alguns ciclistas utilizavam bicicletas
com mudanças. Era uma corrida desigual. Elias Cruz continuava na sua bicicleta
Vilar, com aros de madeira, a não ter mudanças. Mas ele não era homem para
desanimar. Dada a partida, ele põe-se à frente a puxar mesmo sem mudanças e com
uma queda à saída de Viana do Castelo, que o obrigou a esperar cinco minutos
pelo seu carro, mas, apesar de bastante magoado, só um homem conseguiu aguentar
aquele ritmo endiabrado: Alfredo Trindade. E com a meta à vista, Alfredo
Trindade, na sua bicicleta de mudanças, sprintou e venceu a prova. Mas a
atuação do Elias Cruz foi tão surpreendente e meritória que no Jornal Stadium,
publicado no dia seguinte, veio inserida uma fotografia dos dois ciclistas
abraçados com a legenda: “Alfredo Trindade e Elias Cruz vencedores da prova”.»
«As pessoas de São Bernardo, sua terra, sentiam
profundamente tudo isso e viviam com um entusiasmo incomensurável os seus êxitos.
Na hora em que cada prova terminava já uma delegação de São Bernardo, fosse
qual fosse o dia e a hora, estava na Ponte Praça, debaixo dos Arcos, a
aguardar, junto do Placard, a classificação final do Elias. Esperavam horas sem
fim, e quando acontecia, como quase sempre aconteceu, que o Elias era o
primeiro, era o entusiasmo que rapidamente era trazido para a sua terra.
Espontaneamente, as pessoas juntavam-se no pátio de sua casa. A “Tuna” de São
Bernardo, com a sua música e marchas, vinha voluntariamente associar-se à
festa. Era música, dança, alegria, vida, juventude e amizade. Ninguém arredava
pé enquanto o seu Elias não chegasse. Era toda uma terra irmanada e feliz pelo
êxito de um seu patrício.»
Elias Cruz, chegou a gozar de grande popularidade no país,
sendo mesmo considerado o melhor valor do ciclismo nortenho nesse tempo. No
auge de sua carreira, tendo ainda em 1935 vencido no I Circuito da Barra,
abandonou o ciclismo em 1936.
– Equipa de Ciclismo do FC Porto de 1935 que esteve presente nas 12 Voltas à Gafa. Da esquerda para a direita: Rêgo, Fernandes da Silva, Elias Cruz e Nunes da Silva. (in revista “Stadium”)
Com tal decisão prematura pôs termo a uma carreira que
prometia ser brilhante, quando apenas com 25 anos era uma ridente esperança de
muitos mais sucessos.
«Em 1981, em pleno reconhecimento do importante papel que em
termos desportivos Elias Cruz representou, o Centro Desportivo de São Bernardo,
numa pública homenagem, atribuiu-lhe a Medalha de Mérito Desportivo. A esta
homenagem associou-se a Assembleia de Freguesia de São Bernardo que, numa das
suas Sessões Públicas, aprovou, por unanimidade, um voto de congratulação e de
louvor a Elias Ferreira da Cruz.» E «depois de uma vida passada inteiramente em
São Bernardo, na Rua Cega, onde nasceu e sempre viveu, Elias Ferreira da Cruz
veio a falecer no dia 23 de Fevereiro de 1994, encontrando-se sepultado no
cemitério de São Bernardo» (conforme consta na referida página informática da
sua freguesia natal).
Armando Pinto
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