Vê este artigo escrito por Bancada.pt Há conceitos que valem para todos os desportos coletivos com bola. Aqui fala-se da seca de golos do FC Porto.
Olha-se para Marega e, sejamos francos, não se dá grande coisa por ele. Há não muito tempo havia até tarjas a gozar com o avançado que o FC Porto foi buscar ao Marítimo e que, no ambiente desfavorável da época dividida a meias entre Julén Lopetegui e José Peseiro, só podia mesmo fracassar. No entanto, se querem encontrar explicações para a dificuldade que o FC Porto tem tido para marcar nos jogos como visitante, não precisam de procurar muito mais: é que Marega lesionou-se na vitória caseira frente ao Sporting e, desde aí, os dragões fizeram dois golos em quatro jogos. Nos quatro anteriores tinham marcado 15.
Em relação ao desaire em Paços de Ferreira (0-1), muito se falou do antijogo dos pacenses. Na derrota no Restelo (0-2), a justificação mais comum foi a ineficácia na concretização. São duas formas de ver as coisas. A primeira, por muita razão que possa assistir aos portistas, é uma realidade do nosso campeonato e não é controlável pelas equipas que querem jogar – a única coisa que lhes resta é aproveitar o tempo em que conseguem fazê-lo. E o FC Porto não fez isso. Quanto à segunda, a análise podia levar-nos à utilização da estatística, que é válida para explicar muita coisa mas, tal como a justiça, tem de ser cega. E lida. O que falta aqui é explicar a razão pela qual no momento em que perdeu Marega, jogador que compensa evidentes limitações técnicas com um físico que o assemelha aos armários que há em casa dos nossos avós, o FC Porto passou a ser mais ineficaz na finalização. Quando a finalização é, acima de tudo, um gesto técnico.
A pensar nisto, lembrei-me de uma coisa que ouvi a um dos treinadores do meu filho na quinta-feira passada, durante o torneio de qualificação para o Rugby Youth Festival do próximo fim-de-semana – o meu filho joga rugby, desporto que reaprendi a amar nos últimos anos, depois de o ter encarado com alguma indiferença entre o fim das transmissões do Torneio das Cinco Nações na RTP e o momento em que ele começou a jogar, em 2013. O rugby divide os jogadores em duas grandes famílias: os avançados e os três-quartos. Os avançados são geralmente mais corpulentos e robustos; os três-quartos (família na qual se integram os médios de formação e de abertura) mais ágeis e velozes.
Ora, este é o momento em que o leitor pode fazer distinções que, do meu ponto de vista, são erradas. Pode até gozar e dizer que para explicar o futebol do FC Porto é preciso recorrer ao rugby, que acha que é um desporto de brutos, que andam aos encontrões uns aos outros, e não tem nada a ver com o futebol. Aceito que o futebol está cada vez mais transformado num desporto onde o contacto é proibido, por ação de jogadores enganadores, que aproveitam o bafo do adversário para simular uma falta, mas mesmo sendo o rugby um desporto de contacto e colisão, tem em comum com o futebol um aspeto muito simples: só há uma bola e o objetivo da equipa é ganhar terreno em posse para ter condições de finalizar, no futebol com um golo, no rugby com um ensaio.
E foi no momento em que meditava acerca da falta que tem feito Marega ao FC Porto que me lembrei do que disse esse treinador do meu filho na quinta-feira. Não me recordo das palavras exatas, mas foi algo como isto: quando os avançados provocam o choque, não o fazem pelo prazer de andar à cabeçada, mas sim com o propósito de centrar naquele espaço o máximo de adversários, de forma a criar superioridade numérica à ponta, que os três-quartos têm obrigação de aproveitar para chegar com a bola à zona de ensaio. Volto ao início: olha-se para Marega, para aquele físico que no rugby daria um bom terceira linha, e não se dá grande coisa por ele num desporto como o futebol. Mas a forma como ele é capaz de resistir ao choque, de chamar a ele um, dois, às vezes até três defesas adversários, de ganhar profundidade ofensiva em velocidade, acaba por criar condições mais propícias para que os outros finalizem, porque aparecem em zonas menos povoadas de opositores.
No Restelo, contra o Belenenses, além de mais conhecimento entre os dois centrais titulares – a falta de entrosamento entre Felipe e Osório esteve na origem do primeiro golo do Belenenses – o que faltou ao FC Porto foi finalizar em condições mais propícias. Faltou a manobra de diversão da mesma maneira que sobrou uma noite de sonho de André Moreira, o guarda-redes do Belenenses, autor de três ou quatro grandes defesas.